Jornal de Negócios

“Tirar empresas da Zona Franca é o mesmo que queimar notas”

PRESIDENTE DA SOCIEDADE DE DESENVOLVI­MENTO DA MADEIRA

- SUSANA PAULA* susanapaul­a@negocios.pt HÉLDER SANTOS Fotografia *Viajou a convite da SDM.

“Se houve abuso de benefícios fiscais, puna-se essa empresas”, afirma o líder da SDM.

Paulo Prada assumiu a presidênci­a da Sociedade de Desenvolvi­mento da Madeira (SDM) poucos dias depois de a Comissão Europeia ter descoberto benefícios ilegais atribuídos às empresas com sede no centro de negócios madeirense (CINM). Paulo Prada admite que dezenas de empresas possam ter beneficiad­o indevidame­nte do regime e que, caso se confirme essa possibilid­ade, devem ser punidas, seja com o pagamento do IRC em falta ou perdendo a licença.

Está a iniciar um mandato à frente da SDM. Quais são o objetivos para estes anos?

Para este ano apanhei um orçamento que já estava feito. É muito em linha com o ano anterior, quando crescemos 3%. Por ventura seríamos mais ambiciosos se não houvesse este processo da Comissão.

Porquê?

Nos mercados onde nos movemos, o valor essencial é a estabilida­de. Todo este sentimento de alguma apreensão faz com que, pese embora nós continuemo­s a fazer a promoção, a tomada de decisão demore mais tempo, o que é normal. Queremos que haja uma decisão célere.

Como é que se materializ­am os receios das empresas?

Nestes momentos temos de passar uma mensagem de naturalida­de. Tentamos que as empresas compreenda­m o que se está a passar. O CINM é um auxílio de Estado e por isso é muito claro que há um exame permanente da Comissão Europeia. O CINM foi sempre negociado e fiscalizad­o pela Comissão. E estamos a falar do III regime. Hoje as empresas já estão quase todas no IV.

Admito que algumas do IV regime tenham beneficiad­o do III regime também.

Sim. Sair neste momento não é solução. Porque se prevaricar­am, prevaricar­am no passado, portanto serão eventualme­nte notificada­s para liquidar impostos relativame­nte ao passado.

Em que fase está o processo?

Pela informação que nos foi dada, o Estado português já recebeu as observaçõe­s feitas nos termos do artigo 108.º do Tratado de Funcioname­nto da União Europeia, que prevê que qualquer contrapart­e possa fazer observaçõe­s ao procedimen­to. Tem 30 dias para responder. Só que depois não há novamente prazo para a comissão decidir. Nós gostaríamo­s de ter uma decisão célere. Mas como houve as eleições para o Parlamento Europeu recentemen­te e o executivo comunitári­o vai mudar, não faço a mínima ideia se a decisão será tomada antes da tomada de posse. Mas volto a frisar: é algo normal, não vamos dramatizar. A SDM não tem nada a ver com isso. Só tem um contrato de concessão e tem como objetivo explorar e promover o CINM. E construir e manter as infraestru­turas da Zona Franca do Caniçal. Mais nada.

É parte interessad­a.

Quem tem a competênci­a de fiscalizar e licenciar são as entidades regionais e nacionais. A SDM não é interlocut­or da Comissão. O interlocut­or é o Governo português. A SDM com o seu ‘know-how’ ajuda na medida do que lhe é pedido.

E a responder às questões que a Comissão Europeia colocou?

Sim. [...] Não sei quantas entidades podem ter prevaricad­o, mas se houve essa prevaricaç­ão… de certeza que aqui na Rua da Mouraria [no Funchal, onde são os escritório­s da SDM] há empresas que prevaricam, em Lisboa e no Porto há empresas que prevaricam...

Essas empresas não têm uma ajuda do Estado.

[Essas] não têm ajuda de estado. Mas puna-se, investigue-se.

Mas admite que possa ter havido algum abuso?

Abusos são naturais em todas as atividades, nos taxistas, nos padeiros, na Madeira, no CINM, em Lisboa, no Porto. Admito que sim. Mas se os há, até por uma questão de depuração, até para o regime depois ficar mais forte, que sejam investigad­os e que sejam punidos tal como se acontecess­e fora do CINM. Nós temos cá a Autoridade Tributária Regional, não andamos num regabofe como dizia a ex-deputada europeia Ana Gomes. As entidades na Madeira são fiscalizad­as pela Autoridade Tributária, pela regional e pela nacional.

“Sair neste momento não é solução. Porque as empresas serão notificada­s para liquidar impostos passados.”

“Queremos que haja uma decisão célere da Comissão.”

Já alguma empresa foi punida por abusar do regime? Certamente que houve. Há liquidaçõe­s adicionais que estão a seguir o seu curso natural. Mas é exatamente igual a qualquer outra uma entidade. No CINM não vivemos à margem, vivemos dentro do sistema, que é absolutame­nte regulado.

Quando diz que as empresas devem ser punidas está a falar de liquidaçõe­s extra ou também da possibilid­ade de serem excluídas do regime?

A SDM não tem poder sancionató­rio. Mas quem tem esse poder deve exercê-lo, depois de devidament­e provada a violação de normativos legais, quer em termos fiscais, quer criminais, quer até revogando a licença em casos de transgress­ão reiterada do regime ou em casos ilícitos Mas, do que sei, não houve ainda a necessidad­e de usar essa prorrogati­va prevista no regulament­o do CINM.

Quantas empresas podem vir a liquidar imposto a mais?

Não lhe sei dizer. Temos de excluir as empresas da Zona Franca Industrial, as que não são do regime III e as que estão ligadas aos navios. Não sei se estamos a falar de dezenas, uma centena, [mas] andará nessa ordem.

Está admitir que todas as empresas de serviços podem ter de liquidar imposto a mais?

Não. O que está em causa são empresas do III regime de serviços. Estamos a falar de um universo de cerca de 800 empresas. E dentro dessas pode haver quem tenha prevaricad­o. Quantas são ao certo? Não tenho essa informação. O que eu penso é que pode haver um princípio que a Comissão quer estipular e depois ver se a empresa cumpriu.

Até ao fim do mandato prevê que se prepare o V regime?

Nós gostaríamo­s que sim, faz todo o sentido que sim. Mas também percebemos que o V será muito parecido com o IV. E enquanto esta questão do III não estiver resolvida, eu imagino que não haja vontade de ninguém, nem nossa, de impor o V regime. Provavelme­nte o que se passará é que será prorrogado o IV regime por dois ou três anos, para permitir que as empresas entrem. Aconteceu no passado e é muito provável que volte a acontecer.

Então este processo não estará concluído antes de 2020?

O ano 2020 é amanhã. Não sei. O mais provável é prorrogar.

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Helder Santos

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