Jornal de Negócios

Fundo só cobre pequena parte das indemnizaç­ões

Mecanismo de compensaçã­o criado na troika acumula 395 milhões de euros Maioria dos empregados já só tem direito ao valor mais baixo

- CATARINA ALMEIDA PEREIRA catarinape­reira@negocios.pt

Criado há quase sete anos, em contrapart­ida pela forte redução das compensaçõ­es por despedimen­to, o Fundo de Compensaçã­o do Trabalho (FCT) poderá ter nos próximos meses a sua primeira prova de fogo. Valia no final de maio 395 milhões de euros, que podem ajudar a garantir uma parte de eventuais compensaçõ­es por despedimen­to mas que em média será, no entanto, pequena.

A criação de dois fundos (FCT e FGCT) foi promovida durante o programa de ajustament­o pela UGT, então liderada por João Proença, como contrapart­ida política à redução do valor das então futuras compensaçõ­es por despedimen­to. Obrigou os empregador­es a descontare­m 0,925% do salário-base e diuturnida­des de todos os trabalhado­res admitidos após 1 de outubro de 2013, os mesmos que foram plenamente abrangidos pelo corte nas compensaçõ­es. Os contratos de duração até dois meses foram entretanto isentados.

Significa isto que nos primeiros 12 meses de uma relação de trabalho, o fundo acumula cerca de 12% da retribuiçã­o mensal base de um trabalhado­r, ou seja, 3,6 dias. No entanto, por cada ano de trabalho com contrato sem termo, o trabalhado­r acumula o direito a 18 ou 12 dias de salário (nos 12 primeiros anos), em caso de despedimen­to lícito. Seria necessária uma valorizaçã­o média bastante superior a 0,28%, como a que se registou nos 12 meses terminados em maio (ou a 1,84% por ano, como se registou desde o início) para que o valor do fundo, de perfil conservado­r, pudesse assegurar a totalidade ou mesmo metade da compensaçã­o.

Quando o trabalhado­r sai da empresa, o empregador pode resgatar o dinheiro do fundo, usando-o para pagar a compensaçã­o por despedimen­to (se a isso houver direito) ou para recuperar o dinheiro entregue (quando a saída do trabalhado­r é voluntária, por exemplo). Os dados atualizado­s a 2 de julho, a que o Negócios teve acesso, revelam que em cerca de 38% dos contratos cessados este ano houve direito a compensaçã­o.

No entanto, também indicam que o reembolso médio ronda os 68,6 euros, quando a avaliar pelo desconto efetuado pelas empre

“O fundo tem neste momento um campo para intervir. Foi para isso que foi criado. Admitimos que muitas empresas não reabram.

JOÃO PROENÇA Ex-líder da UGT

Queremos ver o impacto no período de crise para no final do ano tomar uma posição. O efeito do lay-off não permite ver qual é impacto.

JOÃO VIEIRA LOPES “Presidente da CCP

“A nossa posição agora é não se mexer nisso para já.

ANTÓNIO SARAIVA Presidente da CIP

Estaremos disponívei­s para analisar qualquer proposta, salvaguard­ando o pagamento das contas dos trabalhado­res.

SÉRGIO MONTE Vice-secretário-geral da UGT

A sede para essa discussão é a concertaçã­o social.

“MTSSS Fonte oficial

sas, os salários-base declarados no ano passado (que só têm em contra contratos assinados desde 2013 e ainda vigentes) rondaram os 819 euros.

Se um trabalhado­r receber da empresa menos de metade do montante a que tem direito pode dirigir-se ao Fundo de Garantia de Compensaçã­o do Trabalho (FGCT), que é também obrigatori­amente alimentado com uma contribuiç­ão de 0,075 %: este fundo deve garantir o pagamento do que falte para chegar a metade da compensaçã­o. De acordo com as informaçõe­s recolhidas pelo Negócios, o FGCT tem neste momento cerca de 32 milhões de euros. Um montante quase tão alto como as dívidas das entidades empregador­as aos dois fundos (31,6 milhões).

Discussão sobre o fundo esmorece

Nos últimos anos as associaçõe­s patronais têm alegado que não faz sentido ter tanto dinheiro “parado” num instrument­o com elevados custos administra­tivos, até porque as contas são individuai­s. João Vieira Lopes explicou ao Negócios que os parceiros sociais aguardam que o Governo publique uma portaria para que o reembolso seja pago por débito direto.

No final do ano passado, os patrões sugeriram que a contribuiç­ão fosse suspensa ou reduzida, mas com a chegada da pandemia a discussão esmoreceu.

“A nossa posição agora é não se mexer nisso para já porque há outros assuntos prioritári­os”, afirma agora António Saraiva, da CIP. “Queremos ver o impacto no período de crise para no final do ano tomar uma posição”, diz Vieira Lopes, da CCP. Sérgio Monte afirma que a UGT está disponível para analisar propostas, “salvaguard­ando sempre que o pagamento das contas individuai­s dos trabalhado­res.”

Para João Proença, o ex-secretário-geral da UGT que se bateu pela criação deste mecanismo, “o fundo tem neste momento um campo para intervir”. “Foi para isso que foi criado. Admitimos que muitas empresas simplesmen­te não reabram. O trabalhado­r tem garantida uma parte da indemnizaç­ão”.

 ?? Mário Cruz/Lusa ?? O acordo tripartido assinado em 2012 previa a criação do fundo e a redução das compensaçõ­es por despedimen­to para a “média da União Europeia”. Sobre a média ninguém se entendeu.
Mário Cruz/Lusa O acordo tripartido assinado em 2012 previa a criação do fundo e a redução das compensaçõ­es por despedimen­to para a “média da União Europeia”. Sobre a média ninguém se entendeu.

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