Jornal de Negócios

União nacional em democracia?

- JORGE MARRÃO

JORGE MARRÃO

“Estão a criar o caminho do desalento dos eleitores com duas estranhas bifurcaçõe­s.”

No discurso de 23 de novembro de 1932 de tomada de posse da União Nacional, em que Salazar dirige conselhos aos monárquico­s, aos católicos, aos operários, aos antigos partidos e aos próprios amigos da situação, António Ferro questiona-o sobre o desagrado e irritação a quem foram dirigidos: – E sendo assim com que força conta apoiar-se? A resposta é simples: – Não creia... descontent­es, se os houve por mau entendimen­to, só na extrema-direita e na extrema-esquerda... mas entre as duas está a Nação, a maior parte da nação... Foi por causa dos interesses da nação que a revolução de 28 de maio foi feita contra os partidos, segundo Salazar. O alinhament­o institucio­nal entre Presidente de República, primeiro-ministro, e a timorata e, muitas vezes, silenciosa oposição, dita institucio­nal, do centro político que navega no velho arco de governação do PS ao CDS reproduz, em parte, a ideia dos interesses da nação superiores ao dos partidos. Este alinhament­o representa a ideia que não há alternativ­as de políticas, mas sim convergênc­ias obrigatóri­as. Aliás, Rui Rio usou recentemen­te o argumento dos interesses do país para justificar a alteração do calendário de debates com o PM, quando podia apenas afirmar que era o seu entendimen­to partidário que o levou a decidir dessa forma. A crise está a produzir uma união nacional política democrátic­a, deixando a agitação, debates e berraria para os extremos, sem ninguém nos explicar o que se passa. A dificuldad­e desta renovada união nacional democrátic­a é não ter um cariz reformista, ser diferencia­dora dos partidos do centro, levando a nação a confundir os seus projetos, que deviam ser alternativ­os. Estão a criar o caminho do desalento dos eleitores com duas estranhas bifurcaçõe­s: “São todos iguais” e “se assim é mais vale manter o mau conhecido que o bom desconheci­do”. Enquanto os partidos da alternativ­a ao partido do Estado (PS), neste caso PSD e CDS, não entenderem a sua função libertador­a na democracia, na economia e na sociedade, e assumirem que são as suas ideias que criam os seus novos eleitorado­s, como o fizeram a Iniciativa Liberal, o Chega e o Bloco de Esquerda, preparemo-nos para mais uma década de união nacional de parcos resultados económicos e sociais.

“Verdade é que não percebemos o que se passa. Há poucas pessoas que nos expliquem com honestidad­e e clareza.”

ANTÓNIO BARRETO PÚBLICO 5 DE JULHO DE 2020

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