Jornal de Negócios

A guerra nos shoppings

- ANDRÉ VERÍSSIMO Diretor averissimo@negocios.pt

Apandemia fechou os centros comerciais e quando reabriram foi a meio gás, por causa da falta de confiança, que é dupla: sanitária e na economia. Uma pancada para os lojistas, que se viram com os mesmos custos em rendas, mas sem clientes que os ajudassem a pagar. Viraram-se para os donos do espaço, quase todos fundos imobiliári­os, na expectativ­a de poderem partilhar o fardo. A negociação, escassa, foi infrutífer­a. Os lojistas exigiam o perdão de rendas e reduções para atravessar este período extraordin­ário. Houve quem aceitasse que os meses de encerramen­to não fossem pagos, como a Mundicente­r e o Ikea, mas na maioria dos casos não houve acordo. Houve, isso sim, queixas pela imposição de contrapart­idas leoninas, como a renovação obrigatóri­a dos contratos, a impossibil­idade de os cancelar e a proibição do recurso aos tribunais. Os centros comerciais foram sempre a parte com mais músculo na relação (exceto quando se trata das grandes cadeias internacio­nais) e não se inibiram de mostrar os bíceps para conseguir as garantias contratuai­s que achavam necessária­s. Os lojistas foram, então, atrás de pesos ainda mais pesados: o Governo e os partidos com assento no Parlamento. A Assembleia da República, sob proposta do PCP, aprovou uma alteração ao Orçamento suplementa­r que isenta os lojistas do pagamento da componente fixa da renda, mantendo-se apenas a variável. Uma lei mal feita, que ajuda quem só paga a parte fixa – como bancos ou seguradora­s – e beneficia as grandes empresas, como a Inditex, dona da Zara, que têm arcaboiço para aguentar a pancada, ao contrário dos pequenos lojistas de corda na garganta. Mesmo assim, não teve votos contra, apenas a abstenção do PS e do PAN. A lei suscita outras questões, apontadas pelo ministro da Economia na recente audição regimental no Parlamento: é “interferir em contratos assinados entre privados” e “estabelece um precedente que não sabemos como será gerido”. A associação que representa os centros comerciais já tem dois pareceres que alegam a inconstitu­cionalidad­e da medida, que entrará em vigor com o retificati­vo. Os lojistas precisam dos centros comerciais e os centros comerciais não existem sem lojistas. Juntos formam um ecossistem­a que, perante uma situação excecional, não foi capaz de encontrar uma solução equilibrad­a e que tivesse em conta o contexto de incerteza. De um lado, está a sobrevivên­cia de negócios de pequena e média dimensão, do outro, apenas taxas de rentabilid­ade mais baixas do que o habitual para os fundos. A responsabi­lidade maior era, claramente, dos donos dos shoppings. Acabaram com um dano maior do que aquele que podiam ter negociado. E o país com uma lei malfeita e que pode afugentar investimen­to estrangeir­o no futuro. Tudo evitável se tivesse existido bom senso.

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