Jornal de Negócios

“Qualificad­o, motivado e apoiado”, Centeno nega conflitos de interesse O único interesse que os administra­dores do BdP perseguem é o interesse público. Não há conflito entre interesse público e interesse público.

Perante a Assembleia da República, Mário Centeno afirmou não ver conflitos de interesse na passagem direta de ministro das Finanças para governador do BdP e garantiu que o único interesse que irá perseguir neste cargo é o interesse público.

- RAFAELA BURD RELVAS rafaelarel­vas@negocios.pt

“Qualificad­o”, com a formação académica e experiênci­a profission­al essenciais para o desempenho das funções; “motivado” para lidar com a crise económica gerada pela pandemia; e “apoiado” para assumir o cargo. Assim é a avaliação que Mário Centeno faz do candidato Mário Centeno ao cargo de governador do Banco de Portugal (BdP).

O antigo ministro das Finanças já foi ao Parlamento defender a escolha do seu nome para governar o BdP, numa audição em que garantiu não ver quaisquer conflitos de interesse na passagem direta do Ministério das Finanças para o regulador da banca, posição contrária à de quase todos os partidos com assento parlamenta­r, e em que assegurou que o interesse público será o único que irá prosseguir enquanto governador.

Ao longo de três horas, a questão do conflito de interesses foi a que foi discutida mais vezes. Em todas elas, o ex-governante insistiu nos mesmos dois pontos. Por um lado, o facto de, noutros países, o exercício de funções enquanto governante ligado às Finanças não ser considerad­o um impediment­o para governar um banco central. “Basta pegar em meia dúzia de países para encontrar vários exemplos. Alemanha, Noruega, Espanha,

Suécia, todos têm governador­es e ex-governador­es que exerceram funções nos governos. Não há nenhuma lei, em nenhum país do mundo, em que isso constitua um impediment­o”, disse.

Por outro lado, garante que o conflito de interesses será avaliado caso a caso. “Se houver uma materializ­ação de uma circunstân­cia, posso garantir que cumprirei escrupulos­amente o código de conduta do conselho de administra­ção do BdP e a lei orgânica do BdP”, afirmou, questionad­o sobre se irá pedir escusa no caso de o regulador ser chamado a atuar em casos nos quais interveio enquanto ministro das Finanças.

Os argumentos não convencera­m a maioria dos deputados, que chegaram ao fim da audição a levantar as mesmas questões que colocaram no início. Uma delas, do PSD, esteve relacionad­a, precisamen­te, com esta desconfian­ça: sente-se confortáve­l em assumir o cargo de governador quando há uma maioria parlamenta­r que se opõe a essa nomeação? “Sinto-me quali

MÁRIO CENTENO Candidato indigitado ao cargo de “governador do BdP

ficado, motivado e apoiado para exercer estas funções”, clarificou.

Conselho de auditoria “tem toda a idoneidade”

Outra questão recorrente foi a composição do conselho de auditoria do BdP, órgão que fiscaliza o regulador e cujos membros foram nomeados por Centeno, que, também aqui, rejeitou haver conflitos de interesse.

“Os membros deste conselho têm toda a idoneidade. Foi o primeiro conselho de auditoria do BdP a não ser dirigido por um ex-membro do conselho de administra­ção do BdP. Se estão em condições de exercer funções, face a uma alteração na governação, cabe ao ministro das Finanças avaliar”, argumentou.

João Leão, o atual ministro das Finanças, fazia parte da equipa de Centeno quando este nomeou este conselho.

O recado (errado) a Costa

No fim, defendeu Centeno, são as qualificaç­ões, o mérito e a prossecuçã­o do interesse público que asseguram a independên­cia. “O único interesse que perseguem os administra­dores do BdP é o interesse público. Como quadro superior do BdP, fui muito exigente nessa matéria. Mantive esse grau de exigência, incluindo o BdP, enquanto ministro. E transporta­rei para a posição de governador essa mesma exigência”, frisou, para resumir: “Não há conflito entre interesse público e interesse público.”

Sobre este ponto, aproveitou para deixar críticas implícitas ao seu antecessor. “Em 170 anos, apenas dois governador­es do BdP tinham relações anteriores com a banca. Um que agora termina o mandato e outro que temos de recuar mais de 80 anos para encontrar. O BdP sempre foi governado pelo interesse público e por pessoas que têm esse interesse público muito claro.”

Não é verdade, contudo, que o BdP apenas teve dois governador­es com ligações anteriores à banca. Para além de Carlos Costa, que foi administra­dor da Caixa Geral de Depósitos e do BCP, António de Sousa, Tavares Moreira ou Manuel Jacinto Nunes, entre outros, foram administra­dores na banca comercial.

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Mário Centeno defende que serão as qualificaç­ões e a prossecuçã­o do interesse público a garantir a sua independên­cia enquanto governador.
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Alexandre Azevedo

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