“Qualificado, motivado e apoiado”, Centeno nega conflitos de interesse O único interesse que os administradores do BdP perseguem é o interesse público. Não há conflito entre interesse público e interesse público.
Perante a Assembleia da República, Mário Centeno afirmou não ver conflitos de interesse na passagem direta de ministro das Finanças para governador do BdP e garantiu que o único interesse que irá perseguir neste cargo é o interesse público.
“Qualificado”, com a formação académica e experiência profissional essenciais para o desempenho das funções; “motivado” para lidar com a crise económica gerada pela pandemia; e “apoiado” para assumir o cargo. Assim é a avaliação que Mário Centeno faz do candidato Mário Centeno ao cargo de governador do Banco de Portugal (BdP).
O antigo ministro das Finanças já foi ao Parlamento defender a escolha do seu nome para governar o BdP, numa audição em que garantiu não ver quaisquer conflitos de interesse na passagem direta do Ministério das Finanças para o regulador da banca, posição contrária à de quase todos os partidos com assento parlamentar, e em que assegurou que o interesse público será o único que irá prosseguir enquanto governador.
Ao longo de três horas, a questão do conflito de interesses foi a que foi discutida mais vezes. Em todas elas, o ex-governante insistiu nos mesmos dois pontos. Por um lado, o facto de, noutros países, o exercício de funções enquanto governante ligado às Finanças não ser considerado um impedimento para governar um banco central. “Basta pegar em meia dúzia de países para encontrar vários exemplos. Alemanha, Noruega, Espanha,
Suécia, todos têm governadores e ex-governadores que exerceram funções nos governos. Não há nenhuma lei, em nenhum país do mundo, em que isso constitua um impedimento”, disse.
Por outro lado, garante que o conflito de interesses será avaliado caso a caso. “Se houver uma materialização de uma circunstância, posso garantir que cumprirei escrupulosamente o código de conduta do conselho de administração do BdP e a lei orgânica do BdP”, afirmou, questionado sobre se irá pedir escusa no caso de o regulador ser chamado a atuar em casos nos quais interveio enquanto ministro das Finanças.
Os argumentos não convenceram a maioria dos deputados, que chegaram ao fim da audição a levantar as mesmas questões que colocaram no início. Uma delas, do PSD, esteve relacionada, precisamente, com esta desconfiança: sente-se confortável em assumir o cargo de governador quando há uma maioria parlamentar que se opõe a essa nomeação? “Sinto-me quali
MÁRIO CENTENO Candidato indigitado ao cargo de “governador do BdP
ficado, motivado e apoiado para exercer estas funções”, clarificou.
Conselho de auditoria “tem toda a idoneidade”
Outra questão recorrente foi a composição do conselho de auditoria do BdP, órgão que fiscaliza o regulador e cujos membros foram nomeados por Centeno, que, também aqui, rejeitou haver conflitos de interesse.
“Os membros deste conselho têm toda a idoneidade. Foi o primeiro conselho de auditoria do BdP a não ser dirigido por um ex-membro do conselho de administração do BdP. Se estão em condições de exercer funções, face a uma alteração na governação, cabe ao ministro das Finanças avaliar”, argumentou.
João Leão, o atual ministro das Finanças, fazia parte da equipa de Centeno quando este nomeou este conselho.
O recado (errado) a Costa
No fim, defendeu Centeno, são as qualificações, o mérito e a prossecução do interesse público que asseguram a independência. “O único interesse que perseguem os administradores do BdP é o interesse público. Como quadro superior do BdP, fui muito exigente nessa matéria. Mantive esse grau de exigência, incluindo o BdP, enquanto ministro. E transportarei para a posição de governador essa mesma exigência”, frisou, para resumir: “Não há conflito entre interesse público e interesse público.”
Sobre este ponto, aproveitou para deixar críticas implícitas ao seu antecessor. “Em 170 anos, apenas dois governadores do BdP tinham relações anteriores com a banca. Um que agora termina o mandato e outro que temos de recuar mais de 80 anos para encontrar. O BdP sempre foi governado pelo interesse público e por pessoas que têm esse interesse público muito claro.”
Não é verdade, contudo, que o BdP apenas teve dois governadores com ligações anteriores à banca. Para além de Carlos Costa, que foi administrador da Caixa Geral de Depósitos e do BCP, António de Sousa, Tavares Moreira ou Manuel Jacinto Nunes, entre outros, foram administradores na banca comercial.