MP queria CMVM a aferir idoneidade dos gestores
O Ministério Público acusa Mexia e Manso Neto de não serem idóneos e diz que a CMVM devia avaliar. A defesa contrapõe com a falta de competências da supervisora nessa matéria e acusa o MP de não ter legitimidade para aferir idoneidades.
Um dos argumentos de António Mexia e João Manso Neto para considerarem ilegal a medida de coação de suspensão de funções é o de que não são gestores públicos nem de concessionárias públicas. Mexia liderava a EDP e Manso Neto a EDP Renováveis. A concessionária pública é a EDP Distribuição, na qual não são administradores.
E mesmo nesta os advogados de defesa de Mexia e Manso Neto sustentam que não seria aplicável a medida. Mas o Ministério Público (MP) argumenta que “António Mexia e João Manso Neto desenvolvem a sua atividade na EDP holding SA e não meramente na EDP Produção [sic] controlando integralmente os destinos e toda a atividade das restantes empresas desse grupo.” São elas pois, segundo o MP, que “assumem o investimento necessário, os riscos financeiros em causa, o planeamento estratégico, etc. Logo, são essas entidades – o grupo como um todo – que se tem de considerar que assumem as concessões”.
A defesa entregou um total de seis pareceres jurídicos, sendo alguns a contestar precisamente a legalidade da aplicação desta medida a gestores de empresas privadas. Estendendo, inclusive, a suspensão a funções em participadas no estrangeiro, o que leva a defesa a acusar o MP de pretender fazer a lei processual penal nacional no estrangeiro.
Carlos Alexandre não teve dúvidas de que “as atividades da REN e da EDP devem ser qualificadas como serviço público, como o exercício de um poder de uma função pública, dependendo de autorizações, licenciamentos, fiscalizações e concessões”.
O papel da CMVM
O Ministério Público, no requerimento em que pede o agravamento das medidas de coação, considera que sendo a EDP e a REN empresas cotadas “devam encontrar-se sujeitas a um especial controlo de idoneidade dos membros dos seus corpos sociais executivos ao nível da sua idoneidade para as atividades por eles desempenhadas”, dizendo mesmo que os critérios de “fit and proper” são aplicados aos arguidos e que se enquadra nas competências da CMVM a avaliação dos administradores. Ora, para os investigadores “o comportamento revelado pelos três arguidos no exercício das suas funções (...) demonstra que eles não são idóneos para o exercício das mesmas”. Face a esta questão, a defesa contrapõe dizendo que o MP não tem “legitimidade nem competência” para dizer que “A, B ou C são ou não idóneos”. Realçam os advogados de defesa que, por outro lado, “a CMVM não detém qualquer competência legalmente prevista a respeito de uma pretensa e putativa função de aferição de idoneidade dos administradores das sociedades cotadas”.
A própria CMVM já tinha esclarecido publicamente não ter a supervisão macroprudencial das cotadas, pelo que não lhe cabe aferir a idoneidade dos administradores. Ainda assim, há outros órgãos sociais para fiscalização.
A defesa argumenta, ainda, que o Ministério Público não tem em consideração os outros órgãos sociais destas empresas, considerando que “tudo se passa como se apenas António Mexia e João Manso Neto se reunissem e decidissem, tudo se passa como, para além destes, apenas existissem homens e mulheres de palha, tudo meros fantoches”, desconsiderando a existência dos outros administradores e elementos que compõem os órgãos sociais.