Jonathan Safran Foer está a tentar outra vez
Além de romancista, o norte-americano é um ativista climático. O seu último livro poupa-nos dos sermões e é uma amálgama de coisas interessantes – e mesmo assim ficou interessante.
Há dois equívocos prévios que este livro pode provocar no leitor. O primeiro é o de que vai ser uma espécie de livro de receitas. Talvez seja o título e a imagem da maçã na capa que induzem em erro. “Salvar o planeta começa ao pequeno-almoço” não é um livro de receitas, ou algo do género. Essa questão “gastronómica” é apenas aflorada em uma ou duas passagens: não comer ao pequeno-almoço (e ao almoço) qualquer alimento de origem animal. O resto do livro explica porquê.
O segundo equívoco é o de se tratar de mais uma obra sobre a emergência climática, repleta de dados assustadores e cenários apocalípticos, terminando com uma vazia mensagem de esperança. É verdade que os dados estão lá, no meio do livro, e são assustadores e estão apresentados de uma forma muito simples e clara, mas o livro também não é isso.
Até porque Jonathan Safran Foer está bem ciente do paradoxo da emergência estar a acontecer, mas a mensagem não estar a passar. As pessoas, diz o autor, têm a ideia de que é algo que se está a passar longe, ou que vai aparecer mais tarde ou mais cedo uma solução milagrosa, ou que a sua ação individual não tem qualquer peso para resolver um problema desta magnitude.
Há quantas décadas se fala do assunto? Pelo menos há quatro. Mas ainda assim duas das maiores democracias (EUA e Brasil) elegeram dois céticos climáticos (Trump e Bolsonaro). “Além de não ser uma história fácil de contar, a crise planetária não demonstrou ser uma boa história. Não só não consegue converter-nos, como não consegue despertar-nos o interesse. (…) Parece impossível de descrever de uma maneira que seja, simultaneamente, verídica e fascinante.” Algures o autor cita Randy Olson, biólogo e cineasta: “O clima é, muito possivelmente, o assunto mais entediante que o mundo da ciência alguma vez teve de apresentar ao público.”
Jonathan Safran Foer ( já autor em 2009 do livro “Comer animais”) tenta então uma abordagem que crie fascínio e interesse. Construiu um livro-alerta repleto de histórias pessoais e familiares, mas também políticas, sociais e históricas. Foer é descendente de refugiados judeus e várias dessas histórias vêm da II Guerra: o desembarque das tropas aliadas na Normandia, os discursos de Roosevelt, os sacrifícios e os pequenos gestos que milhões de americanos tiveram na II Guerra e a sua avó polaca, que foi a única na família que teve clarividência e tomou medidas: fugiu dos nazis e salvou-se.
O livro é uma amálgama de inúmeros assuntos. O ativismo negro dos anos 1950, o aluguer de abelhas polinizadoras, o dia da Ação de Graças, os casos de assédio sexual na Google, Al Gore, psicologia cognitiva, missões espaciais, a invenção dos óculos e dos espelhos, ou o suicídio do avô. Como é que isso tudo se liga ao clima? Jonathan Safran Foer fá-lo com paciência e entusiasmo admiráveis.