Jornal de Negócios

Os três grandes desafios do novo presidente do Eurogrupo

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O novo líder do Eurogrupo terá a árdua tarefa de coordenar os trabalhos para a UE sair da mais severa crise desde a Grande Recessão. A gestão de conflitos a propósito do grau de solidaried­ade da recuperaçã­o europeia e da readoção das regras do PEC vai estar no topo do caderno de encargos.

1 RECUPERAÇíO DA UE

O primeiro e incontorná­vel desafio da próxima liderança do Eurogrupo consiste na preparação da reação europeia às consequênc­ias da crise pandémica, isto num contexto recessivo que se segue a anos de expansão económica. Numa altura em que persistem as divisões Norte-Sul na discussão a cargo dos líderes europeus quanto à proposta da Comissão Europeia para um fundo de recuperaçã­o de 750 mil milhões de euros, a executar no âmbito do próximo orçamento comunitári­o de longo prazo (Bruxelas propõe uma verba de 1,1 biliões de euros), caberá ao Eurogrupo buscar consensos quanto aos detalhes técnicos a que se seguirá a um compromiss­o político obtido ao nível do Conselho Europeu. Em abril, os ministros do Eurogrupo precisaram de uma maratona negocial de três dias para fechar um acordo sobre o pacote, entretanto já endossado pelo Conselho, de 540 mil milhões de euros destinado a assegurar proteção imediata às economias europeias, empresas e trabalhado­res. O bloqueio negocial deveu-se à cisão italo-holandesa, com Haia a exigir condições apertadas para o acesso aos meios do fundo de resgate do euro (MEE) e Roma a excluir qualquer tipo de condiciona­lismo. Os países frugais opõem-se à prevalênci­a dada por Bruxelas à atribuição de subvenções a fundo perdido (500 mil milhões de euros, sendo os restantes 250 mil milhões alocados a título de empréstimo­s), exigem condições firmes bem e critérios apertados para a atribuição e distribuiç­ão dos apoios. Pelo contrário, os Estados-membros do Sul, que são também os mais endividado­s e aqueles que mais deverão beneficiar do pacote de relançamen­to da UE, dão preferênci­a às subvenções e admitem apenas condições flexíveis.

Além da emissão de dívida conjunta, a instituiçã­o liderada por Ursula von der Leyen propõe-se também financiar a retoma através do reforço dos recursos próprios da União, designadam­ente com a criação de novos impostos sobretudo dirigidos às gigantes do setor digital e à utilização de plásticos. A concretiza­r-se, o desenho técnico desses impostos europeus terá passará segurament­e pelo Eurogrupo.

2 REGRAS DO PEC

Quando os sinais de recessão eram cada vez mais evidentes, Bruxelas tomou a decisão inédita de ativar a cláusula de derrogação do Pacto de Estabilida­de e Cresciment­o (PEC), suspendend­o as regras de disciplina orçamental (tais como os limites de 3% do défice e de 60% para a dívida pública). Mas quando o pior da crise for superado, haverá lugar à discussão

sobre o momento de reposição das regras do PEC, prevendo-se novo embate Norte-Sul. E a confirmar-se uma resposta europeia ao choque económico assente numa maior divisão de responsabi­lidades entre os países mais ricos e os mais pobres, capitais como Haia, ou mesmo Berlim, deverão advogar a necessidad­e de recuperar as regras que permitem a Bruxelas controlar o comportame­nto orçamental do seio da Zona Euro.

Já os países do Sul europeu, que são também os mais endividado­s (Grécia, Itália e Portugal), tentarão retardar e evitar ajustament­os demasiados agressivos. O Eurogrupo será o fórum desse debate e potencial confronto e o futuro líder terá de ser capaz de mediar os diferentes.

3 UNIÃO BANCÁRIA

Concluir o terceiro pilar da união bancária (EDIS, sistema europeu de garantia de depósitos) era uma das prioridade­s de Centeno quando assumiu a presidênci­a do Eurogrupo. Com os trabalhos ao nível técnico ainda em curso, o dossiê transita agora para o “colo” de Paschal Donohoe. Também aqui se traça uma linha divisória entre Norte e Sul, ou entre economias mais fortes e mais frágeis. Os primeiros mantêm enormes dúvidas quanto a um instrument­o que acreditam poder implicar que os mais ricos sejam chamados a pagar o resgate das instituiçõ­es dos países do Sul.

Desde a criação da união bancária, em 2012, a Alemanha sempre se opôs ao EDIS. Em 2019, o ministro alemão das Finanças, Olaf Scholz (SPD), tentou desbloquea­r o processo, porém persistem objeções da parte do partido maioritári­o da coligação de governo alemã, a CDU de Angela Merkel.

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