Finanças temem que Banco de Fomento vá ao défice
A instituição criada pelo Governo para apoiar as empresas com financiamento acessível pode vir a ter impacto nas contas públicas, à semelhança do Fundo de Resolução. Classificação está a ser avaliada pelo INE.
Já não bastava o Fundo de Resolução com os impactos do Novo Banco. Agora, o recém-criado Banco de Fomento também pode ir parar ao défice e à dívida pública, agravando indicadores que estão sempre sob os holofotes dos mercados – e do Governo.
Onovo Banco Português de Fomento, que será criado para apoiar as empresas com financiamento acessível e seguros de crédito à exportação, poderá vir a contar para o défice e para a dívida pública. Este é, pelo menos, um receio dentro do Ministério das Finanças, apurou o Negócios. À luz das regras europeias, a dúvida tem razão de ser.
Em agosto, a Comissão Europeia autorizou a criação do novo Banco Português de Fomento (BPF), ao abrigo da lei da concorrência e das ajudas de Estado. O objetivo desta nova instituição financeira será colmatar falhas no mercado, disponibilizando crédito a custos comportáveis às empresas que são consideradas viáveis, ou que têm bons projetos, mas que de outro modo não conseguem aceder a financiamento.
A expectativa do Governo era que esta entidade não fizesse parte do perímetro das Administrações Públicas, até porque haverá casos noutros países europeus onde assim é. Esta era uma condição importante porque só se ficar fora do perímetro é que a sua dívida, e eventual défice, não contam para a dívida pública nem para o saldo orçamental com que Portugal se compromete todos os anos perante o Parlamento e Bruxelas – dois indicadores que são seguidos à lupa pelos mercados.
Ao que o Negócios apurou, há uma forte possibilidade de as regras se virarem contra a vontade do Executivo. Tal como no caso do
Fundo de Resolução, quem decide se uma entidade faz parte do perímetro é o Instituto Nacional de Estatística (INE) num primeiro momento, e o Eurostat, que depois escrutina e valida a decisão. A vontade do Governo aqui vale pouco: pode argumentar e dar os seus pontos de vista, mas é difícil alterar a decisão dos estatísticos, que nesta matéria são soberanos. “A classificação por setor institucional do Banco Português de Fomento, S. A. ainda se encontra em análise”, diz o INE, em respostas ao Negócios.
Segundo o Sistema Europeu de
Contas de 2010, o conjunto de regras que norteia estas decisões, há desde logo um critério-chave para determinar se uma entidade faz parte do perímetro: o teste de mercado. “As unidades do setor público que não são mercantis são classificadas nas administrações públicas e as entidades do setor público mercantis” ficam fora, lê-se no manual.
O teste de mercado
Como é que se determina se uma entidade é mercantil? Estas são entidades “que providenciam toda ou a maior parte do seu produto ( bens e serviços) a preços que são
“A classificação por setor institucional do Banco Português de Fomento ainda se encontra em análise”, diz o INE.
economicamente relevantes”, indicou o Eurostat ao Negócios, em respostas sobre a classificação de entidades, em agosto.
Dito de outro modo, esclareceu ainda o organismo de estatísticas de Bruxelas, “para ser considerada mercantil, uma entidade tem de vender os seus produtos a um preço economicamente relevante o que, na prática, é avaliado através da pergunta sobre se o produto das suas vendas cobre a maioria dos seus custos de produção”.
No documento de aprovação da criação do Banco de Fomento, a Comissão Europeia clarifica o se
guinte: “As autoridades portuguesas reconhecem que não é esperado nenhum retorno económico do capital de 255 milhões de euros investido no BPF.”
Também explica que, “ao dirigir-se às falhas de mercado e agir de forma que seja um complemento do mercado comercial, o BPF aceita por definição projetos que não seriam (ou pelo menos na mesma medida e sob as mesmas condições) aceites por um privado”. Além disso, continua a equipa de Margrethe Vestager, “as autoridades portuguesas não providenciaram à Comissão projeções detalhadas que demonstrem que o BPF deverá gerar um retorno dos 255 milhões de euros de capital que investidores privados pudessem aceitar”. Antes pelo contrário, “o BPF quer ser um investidor que também tem em consideração um retorno social mais lato quando faz investimentos”. Esta análise dificulta a classificação do banco fora do perímetro.
Tanto a IFD como a SPGM, as entidades que, juntamente com a PME Investimento, serão alvo de fusão para criar o BPF, estão incluídas nas contas das administrações públicas, consolidando a sua dívida e o seu défice com os da República. Mas isso não é determinante para este caso, conforme explica o INE: “o facto de a instituição resultar da fusão de entidades que estão consideradas em setores institucionais diferentes não é determinante para a sua classificação, sendo necessário avaliar aprofundadamente as funções e modo de atuação da entidade.” A decisão só será tomada em março do próximo ano, no âmbito da notificação do Procedimento por Défices Excessivos.
O Negócios contactou o Eurostat para mais esclarecimentos, mas não foi possível obter resposta até ao fecho da edição.