Imobiliário afasta bolhas, mas pede fim gradual das moratórias
Os operadores do imobiliário acreditam que não estão reunidos os fatores que levariam a uma bolha no setor, mas admitem que o prolongamento da crise sanitária poderá ter um impacto profundo.
A queda das vendas e o travão na subida acelerada dos preços dos imóveis já são notórios. Mas o setor rejeita que possa estar iminente um “crash” no imobiliário, por não estarem reunidas as condições para tal. Mesmo assim, os operadores do setor reconhecem que as moratórias do crédito estão a estancar parte da crise e pedem que as mesmas não sejam eliminadas por completo quando terminar o prazo definido, mas de forma gradual.
Os dados mais recentes já ilustram bem este abrandamento do setor. No segundo trimestre deste ano, segundo o Instituto Nacional de Estatística (INE), foram transacionados 33.398 alojamentos familiares, o número mais baixo desde 2016 e uma quebra de 22% em relação a igual período deste ano. Estas casas foram transacionadas por um total de 5.144 milhões de euros, um mínimo de 2017 e menos 15% face ao segundo trimestre de 2019.
Mas o cenário, acreditam os operadores do setor, não é de colapso, nem semelhante àquele a que se assistiu na última crise financeira. Isso mesmo nota Luís Lima, presidente da Associação dos Profissionais e Empresas de Mediação Imobiliária de Portugal (APEMIP). “Duas das principais razões que levaram à última crise, e que poderiam criar condições para uma nova bolha no imobiliário, não existem hoje”, diz ao Negócios, referindo-se ao excesso de endividamento e ao excesso de oferta imobiliária que se verificavam em 2008.
O mesmo é apontado por Pedro Lancastre, presidente da JLL Portugal. “Não é nada expectável [que exista uma bolha]. Para isso, teria de haver uma oferta massiva de habitação no mercado, algo que não há, nem irá acontecer. Continuamos com níveis de procura superiores à oferta, tanto por parte do mercado nacional como do internacional”, nota.
A imprevisibilidade trazida pela pandemia, contudo, faz com que o setor admita um impacto mais profundo. Num cenário em que a cura para a covid-19 tarda em chegar, e em que as moratórias deixem de existir, “é provável que muitos agregados familiares com pessoas em situação de desemprego tenham menos capacidade para pagar as prestações das casas”, o que levará ao aumento do crédito malparado e a uma consequente “postura mais cautelosa na atribuição de crédito por parte dos bancos”, reconhece Pedro Lancastre. Com “maior risco e aumento dos spreads, o imobiliário sairá prejudicado”. Este é, ainda assim, “um cenário pessimista”.
Para evitar o pior dos desfechos, Luís Lima defende a mudança gradual das condições de acesso às moratórias, “nomeadamente começando-se por se pagar apenas os juros, o que já está previsto na extensão para algumas empresas”. Em causa estão as empresas que desenvolvem atividade em setores que não tenham sido especialmente afetados pela pandemia como aconteceu com o alojamento e restauração, e que já voltaram a pagar os juros, mantendo-se a moratória apenas ao reembolso de capital.
A aplicação desse modelo a outras entidades seria, então, uma alternativa para impedir o colapso do imobiliário. Se, por outro lado, for feita uma passagem “radical” da atual solução para a amortização total dos créditos que estão a beneficiar das moratórias, acredita Luís Lima, o setor estará perante “uma situação muito difícil”.
E mesmo um prolongamento das atuais medidas poderá vir a ser necessário. “Se não estiver resolvido o problema da saúde, alguma coisa vai ter de se fazer, nem que seja outra extensão das moratórias”, afirma .
“Não é nada expectável [que exista uma bolha no imobiliário]. Para isso, teria de haver uma oferta massiva de habitação, algo que não há, nem irá acontecer. PEDRO LANCASTRE Presidente da JLL Portugal
Podem ir mudando, de forma gradual, as condições das moratórias, nomeadamente começando-se por pagar apenas juros, o que já está previsto para algumas empresas. “LUÍS LIMA Presidente da APEMIP