Jornal de Negócios

Gostar não chega

- FERNANDO ILHARCO Professor na Universida­de Católica Portuguesa

Trabalhar no que se gosta é bom, qualquer um concordará. O problema é que o facto de se gostar do que se leva cabo, fazendo-nos sentir bem, pode não ser indicação de qualidade naquilo que fazemos. Gostamos, estamos satisfeito­s, mas podemos estar a fazer mal as coisas. Podemos estar a fazê-las sempre da mesma maneira, não aprendendo, nem melhorando. Uma pessoa tende a acreditar que, porque gosta, está a fazer bem. Mas o facto é que a relação entre fazer o que gostamos e as coisas serem bem feitas não é óbvia.

Serena Williams, uma das melhores jogadoras de ténis de sempre, disse um dia: “Nunca gostei lá muito de ténis…” E ganhou

Roland Garros, Wimbledon, o Open dos EUA, a Austrália e por aí fora… Isto coloca a questão de qual o papel do gosto na alta performanc­e?

Por um lado, gostar do que se faz, evidenteme­nte, facilita que se faça mais vezes, que uma pessoa se dedique mais, que mantenha a motivação e que, em geral, tenha mais energia e envolvimen­to no que faz. No entanto, as coisas podem funcionar de outra forma. Pode gostar-se de jogar ténis, de liderar equipas de trabalho, etc., mas pode ser o caso, por mais que joguemos e lideremos, de não subirmos a qualidade no que fazemos. Muito boa gente passa uma vida a jogar ténis e nunca melhora por aí além a performanc­e.

Aliás, muitas vezes, o passar do tempo a fazer a mesma coisa faz baixar, e não subir, a qualidade. Ao gostar do que fazemos, sentimo-nos bem, e podemos entrar em piloto automático, divertirmo-nos, e as coisas não evoluem.

Contudo, gostar do trabalho que temos é um bom ponto de partida para melhorar o desempenho. Mas, por si só, não melhora coisa alguma. Além da atitude e do método de trabalho existe ainda um outro aspecto importante no gosto pelo trabalho e no alto desempenho: os resultados que se conseguem. O envolvimen­to, o esforço e a obtenção de resultados positivos e rápidos são das dinâmicas de motivação e sucesso mais relevantes na vida profission­al. A dedicação, a aprendizag­em de novas práticas, o esforço para melhorar, a repetição e os resultados positivos, são o caminho para a alta performanc­e. Esse é o testemunho de Serena Williams, que dizendo que nunca gostou muito de ténis… referiu o que na sua perspectiv­a a tinha feita uma campeã: “Se ao longo do ano bateres meio milhão de bolas e em todas elas quiseres melhorar, vais ser campeã.” 

Não é linear a relação entre o gosto pelo trabalho e a performanc­e.

Artigo em conformida­de com o antigo Acordo Ortográfic­o

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