Empresa pública com dedo da Champalimaud
Antes de a Cimpor ser constituída, os trabalhadores do grupo Champalimaud não queriam uma empresa única. A tarefa foi difícil, mas a nova cimenteira lá nasceu em 1976, um ano em que não faltavam desafios.
ACimpor foi uma empresa pública feita a régua e esquadro por Torres Campos, presidente da Comissão de Reestruturação da Indústria Cimenteira e primeiro presidente da Cimpor a partir dos ativos nacionalizados a 9 de maio de 1975.
Entre esses ativos estavam a Cisul, de Mário Gaspar, com fábrica em Loulé; a Cinorte, de Manuel Queiroz Pereira, com fábrica em Souselas; a Cibra, de Joaquim Matias e fábrica em Pataias; e as empresas de António Champalimaud – a Companhia de Carvões e Cimentos de Cabo Mondego, a Empresa de Cimentos de Leiria, que tem fábrica em Maceira, a Companhia Cimento Tejo, com produção em Alhandra, e a Sagres-cimentos do Algarve. Havia ainda a titularidade das ações nacionalizadas da Secil (58,94%), sendo o restante de empresas dinamarquesas. Mas esta participação na Secil passou para o IPE em 1980.
A tarefa não foi isenta de dificuldades. Um gestor que esteve na Comissão revelou que a maioria dos trabalhadores pertencera às empresas do Grupo Champalimaud e não queria a constituição de uma empresa única, mas uma empresa que fosse constituída só pelas antigas empresas do grupo. “O Torres Campos batia-se muito pela empresa única, mas a dificuldade era muito grande, porque os trabalhadores não queriam. Se estes dissessem que não, o governo não fazia a concentração, porque, na altura, as comissões de trabalhadores tinham muito poder. Se os trabalhadores fossem para a rua protestar contra a empresa única, esta já não se fazia”.
Para isso prometeu-se que todas as unidades de produção teriam um representante na administração. A nova empresa, que nasceu a 2 de abril de 1976, recebeu como herança uma capacidade produtiva instalada de 3,6 milhões de toneladas de cimento, tendo um conselho de gestão com 12 elementos, que em 1980 foi reduzido a cinco.
Em 1976 os grandes desafios que se colocavam à nova empresa tinham a ver com a energia, a adequação da oferta à procura, ou seja, a produção e a distribuição, a gestão financeira e os preços, num contexto de dificuldades acrescidas, devido ao contexto social, político e económico.
A pressão de consumo de cimento remontava a 1973 e prosseguiu nos três anos seguintes, com percentagens de utilização dos equipamentos na ordem dos 102% em 1974, 96% em 1975 e 93% em 1976, quando o normal seria uma taxa de utilização de 85% a 90%.
Em 1977 os jornais faziam eco das queixas generalizadas sobre a falta de cimento e os preços especulativos. Entraram em funcionamento as linhas de produção que estavam previstas antes da nacionalização e foram feitos novos investimentos, e, em 1983, a Cimpor atingiu a produção de seis milhões de toneladas por ano. ■