Jornal de Negócios

O regresso de Paddy Cosgrave à Web Summit é arriscado?

Especialis­tas em comunicaçã­o têm perspetiva­s diferentes sobre as consequênc­ias da decisão de Cosgrave. Será que já sanou as diferenças com Israel e as multinacio­nais que boicotaram a Web Summit? Ou está a fazer um “jogo muito perigoso?”

- VÍTOR RODRIGUES OLIVEIRA vitorolive­ira@negocios.pt

Como se tivesse tirado um período sabático, sem fazer referência ao terramoto que as suas declaraçõe­s, em outubro passado, provocaram na Web Summit, Paddy Cosgrave anunciou esta segunda-feira, de forma surpreende­nte, o regresso a presidente executivo daquele certame em Lisboa.

“Hoje estou de volta como CEO da Web Summit. Quando me afastei no ano passado, foi a primeira vez que tirei uma folga em 15 anos”, escreveu Paddy Cosgrave na rede social X, acrescenta­ndo que teve “tempo para pensar na Web Summit, na sua história” e nos seus objetivos iniciais. “Aproveitei o tempo para me reconectar com velhos amigos da Web Summit”, disse ainda – sem dizer quais –, garantindo que ouviu “o que tinham para dizer”.

Afirmando que quer “construir comunidade­s ainda mais fortes” neste evento, Paddy Cosgrave deu também um sinal de querer mudanças: “À medida que a Web Summit se torna maior, o nosso objetivo deve ser torná-la mais pequena para os nossos participan­tes. Mais íntima. Mais convivial”, revelou, garantindo que está “incrivelme­nte entusiasma­do”.

Encenação para acalmar os investidor­es?

Rodrigo Viana de Freitas, CEO da Central de Informação, admite que a demissão de Cosgrave em outubro possa “ter sido meramente encenada para acalmar os investidor­es e principais parceiros do evento”. Na altura, “foi necessária uma solução que parecesse radical, para que agora, cinco meses depois, a sua liderança deixasse de ser um problema”, afirma ao Negócios.

O responsáve­l da agência de comunicaçã­o acredita ainda que se Cosgrave assume o regresso “é porque está definitiva­mente sanada a relação com Israel e com as principais tecnológic­as”.

Seja como for, é um episódio paradigmát­ico: “As crises reputacion­ais são passageira­s, o que é hoje uma certeza amanhã poderá não ser e os valores das marcas e dos seus gestores podem ser condiciona­dos pelo poder do capital”, conclui.

“[Saída ter sido de meramente Paddy] pode encenada para acalmar investidor­es e principais parceiros. RODRIGO VIANA DE FREITAS CEO da Central de Informação “Vamos ver o que acontece agora neste jogo muito perigoso de quem parece ter mais princípios. DANIEL SÁ Diretor executivo do IPAM

Pressão sobre a Web Summit “pode voltar com força”

Daniel Sá, diretor executivo do Instituto Português de Administra­ção de Marketing (IPAM), sublinha, por outro lado, que Cosgrave “nunca disse que se afastaria para sempre”. E diz não ter a certeza “se Paddy volta porque quer ou se volta porque mais ninguém quer”.

O especialis­ta em marketing acredita ainda que “a pressão pode voltar com força” sobre a Web Summit. Em outubro passado, algumas das maiores tecnológic­as mundiais boicotaram o evento depois de Paddy Cosgrave ter sugerido que Israel estava a cometer crimes de guerra na Faixa de Gaza, após o ataque do Hamas. E de seguida, apesar do pedido de desculpas, acabaria por apresentar a demissão de CEO. Foi substituíd­o por Katherine Maher, a antiga diretora executiva da Wikimedia Foundation, que liderou o evento de novembro mas saiu no mês passado.

“Vamos ver o que acontece agora neste jogo muito perigoso de quem parece ter mais princípios”, afirma Daniel Sá.

 ?? José Sena Goulão/lusa ?? Paddy Cosgrave demitiu-se de CEO da Web Summit em outubro do ano passado após declaraçõe­s polémicas sobre Israel.
José Sena Goulão/lusa Paddy Cosgrave demitiu-se de CEO da Web Summit em outubro do ano passado após declaraçõe­s polémicas sobre Israel.

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