De derrota em derrota
Quase que apetece adaptar um velho ditado popular e afirmar que “de derrota em derrota, lá vai o Ministério Público enchendo o papo”. Cada uma mais humilhante do que a outra.
Não que a recente decisão do Tribunal da Relação no processo Influencer possa ser recebida com alguma surpresa, apesar das implicações significativas para a credibilidade do Ministério Público (MP). Ainda assim, o que mais choca naquele acórdão é a “ausência de indícios” que os juízes desembargadores em questão evocaram para fundamentar a sua decisão.
Bem sei que algumas vozes entendem ser cedo para avaliar completamente a atuação do MP, mas entendo existir, desde já, espaço para uma análise criteriosa e profunda reflexão sobre a forma de trabalhar por parte dos procuradores da república, em particular do DCIAP.
É óbvio que dúvidas intelectualmente sérias existem sobre esta investigação e interrogações se levantam sobre como foi conduzida, da mesma forma que cada vez mais fica amplamente esplanada, a total falta de confiança popular na solidez do trabalho do MP. O que por si só é no mínimo constrangedor, para não dizer altamente perigoso.
A última coisa que poderá acontecer é a contaminação da imagem de total competência, isenção e imparcialidade do Ministério Público em Portugal. É essencial que haja transparência e rigor na análise das investigações para se manter a confiança na instituição da Justiça.
Em abono da verdade, se não fossem aqueles 75.000 euros em dinheiro vivo “caídos do céu” apreendidos a Vítor Escária, não havia ponta por onde pegar neste processo, o que mais difícil torna a sua compreensão.
Assim, parece cada vez mais claro que esta Operação Influencer apenas ficará para a história como aquela que derrubou, de forma leviana e precipitada, um Governo democraticamente eleito.
Porém, em resposta às críticas de que foi alvo, Lucília Gago afirmou perentoriamente que a magistratura continuará incólume, será de desconfiar que o humilde exercício de introspeção e penitência não irá acontecer de forma voluntária por quem dirige a filosofia do MP.
Contudo, algo ainda mais surpreendente (ou talvez não, em virtude da cada vez mais confusa mistura dos poderes judicial, legislativo e executivo que aqui aludíamos na passada semana), decorre do mesmo acórdão da Relação, a lembrança de que “não existe legislação em Portugal sobre a atividade de lóbi, legislação que a existir, evitaria muitas situações dúbias como algumas daquelas que foram apuradas nos autos”.
Ou seja, são os juízes desembargadores que alertam o legislador ( leia-se partidos com assento na Assembleia da República) para o pragmatismo da cada vez mais necessária legalização da atividade de lóbi em Portugal, apesar de ser claramente uma questão complexa que envolve diversos fatores.
Ainda assim, acredito que a sua legalização poderá trazer mais clareza para as atividades de influência política. Obviamente que se torna essencial que qualquer movimento em direção à sua legalização seja acompanhado de medidas rigorosas para garantir a integridade do processo político, mas pelo menos passamos a deixar de ter comportamento de avestruz.
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A Operação Influencer ficará para a história como a que derrubou um Governo democraticamente eleito.