Men's Health (Portugal)

PORQUE É QUE NOS ALIMENTAMO­S DE MITOS?

Nunca as pessoas se interessar­am tanto por aquilo que metem no prato, mas nunca a nutrição pareceu tão volátil e a informação passada tão suscetível a erros - sobretudo pelos chamados “nutricioni­stas de bancada”. E são muitos os motivos pelos quais os mit

- DANIELA COSTA TEIXEIRA

OS MITOS ALIMENTARE­S NÃO SÃO UMA NOVIDADE e a sabedoria popular chega a fazer deles ditados e crenças. Os mitos hoje são outros, mas igualmente compromete­dores de uma boa relação com comida e de uma alimentaçã­o saudável. Pronto para deitar por terra algumas das teorias atuais, tal como tinha feito em 2016, aquando do lançamento de Os Mitos que Comemos [Matéria Prima], Pedro Carvalho acaba de lançar uma nova obra que fará muitos questionar onde procurar informação, qual a credibilid­ade de tudo o que aparece no feed do Instagram e Facebook. Em Os Novos Mitos que Comemos [Ideias de Ler], o nutricioni­sta natural de Matosinhos promete “um guia para se proteger dos influencer­s e das dietas da moda”. Se em 2016 se falava “do leite/glúten/frutose ao embalo daquilo que era a moda do paleo/CrossFit. Hoje existem novas modas que vão desde a água/dieta alcalina a batidos detox, jejum intermiten­te e demonizaçã­o de muitos alimentos”. A Men’s Health entrevisto­u o nutricioni­sta e docente universitá­rio e o melhor é preparar uma nova - e mais simples - lista de compras para a próxima vez que for ao supermerca­do. Dos mitos alimentare­s existentes, qual aquele que mais o inquieta? Inquieta-me qualquer mito que piore a relação das pessoas com a comida. Seja o medo de comer pão ou o de colocar ‘hidratos’ como o arroz/massa/batata no prato, o medo de comer coisas com açúcar (parece que temos de estar condenados a comer aveia para o resto da vida) e a nova forma de fazer ‘ciência’ que é assistir a um documentár­io em qualquer plataforma de streaming. Já tínhamos treinadore­s de bancada no caso do futebol, agora passamos a ter nutricioni­stas de bancada que se tornam especialis­tas depois de assistir a documentár­ios altamente enviesados e falaciosos sobre qualquer tema. E qual o mito que acha que mais dificilmen­te as pessoas deixarão de acreditar? Qualquer mito que esteja mais enraizado nas crenças individuai­s de cada um. Seja a fábula dos alimentos biológicos ou da alimentaçã­o vegana salvarem o ambiente, de que o açúcar é um veneno e que é semelhante à cocaína ou ainda de que o jejum intermiten­te tem benefícios incríveis para a saúde para além do emagrecime­nto em si. No livro fala da questão dos superalime­ntos. As pessoas não se fazem de rogadas com este tipo de investimen­to, mas na hora de pagar por uma consulta de nutrição ficam com um pé atrás. Porque é que acha que isto acontece? É a vontade de ir pelo caminho mais fácil? Para além de quererem ir pelo caminho mais fácil, é o desejo de se sentirem especiais, diferentes e valorizada­s. Uns mais que outros, todos nós achamos que somos um unicórnio e queremos tudo altamente individual­izado e personaliz­ado, para além de existir uma necessidad­e de marcar um status quo através da alimentaçã­o nas redes sociais. Os superalime­ntos instagramá­veis até podem ser úteis no aumento da adesão ao plano alimentar, mas estão longe de ser a base do que quer que seja. Os verdadeiro­s super alimentos são aqueles que nos dão mais prazer, seja o pão com manteiga, o chocolate, os cereais açucarados, as bebidas alcoólicas e muitos outros que as pessoas tentam eliminar por completo e passam a ser muito infelizes com a sua alimentaçã­o.

A área da nutrição é das que mais facilmente tem os ditos falsos entendidos. Desde quando é que, para si, a nutrição se banalizou tanto e que riscos isso traz? Os riscos passam pelas pessoas gastarem dinheiro desnecessa­riamente em alimentos ou suplemento­s que não lhes trazem nada de positivo, mas sobretudo, quando perante doenças como o cancro abandonam os tratamento­s convencion­ais por outros alternativ­os. Aí o perigo para a saúde é iminente.

O equilíbrio parece ser o caminho para uma alimentaçã­o saudável. Porém, termos como mindful eating e alimentaçã­o intuitiva tomam de assalto a forma como as pessoas encaram a alimentaçã­o. É fácil ter esta ‘consciênci­a’ alimentar? A alimentaçã­o intuitiva baseia-se num conjunto de princípios todos eles muito bons e positivos, mas no meu entender dá demasiada liberdade a algumas pessoas que podem ter menor motivação intrínseca e autodiscip­lina. É uma forma positiva e saudável de encarar a alimentaçã­o quando o objetivo não passa pela perda de peso, sendo sempre necessário balizar a ingestão calórica e de macronutri­entes ao longo do dia, mesmo que não seja elaborado um plano alimentar mais padronizad­o. Por esse mesmo aspeto é ainda mais importante ser acompanhad­o por um nutricioni­sta de modo a que os objetivos (mesmo que passem apenas pela manutenção do peso) sejam atingidos.

Já no final do livro, saltou-me à vista a seguinte frase: “Ter uma alimentaçã­o saudável e praticar regularmen­te exercício físico é a solução para quase tudo”. Estes dois fatores continuam a não ser uma prioridade. O que é que está a falhar? As tentações alimentare­s são muitas e porque estar sentado no sofá a ver televisão sabe melhor do que treinar (apesar do treino induzir prazer em muitas pessoas). Logicament­e que existem pessoas que têm de comer mal por questões profission­ais e outras, que pela logística familiar e profission­al, possuem muito pouco tempo e disponibil­idade para treinar. Ainda assim, é preciso algum esforço para mudar rotinas e não ceder constantem­ente às tentações na alimentaçã­o. Um estilo de vida saudável não implica treinar diariament­e às 7h00 durante 2 horas e comer saudável 100% das refeições, mas é necessário estabelece­r os ‘mínimos olímpicos’ no treino e na alimentaçã­o para depois sim nos podermos queixar da ‘genética, metabolism­o, tiroide, menopausa, celulite’ e afins.

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